quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013


Era quase meia-noite, não havia um ser vivo pelas redondezas àquela hora da noite. O temporal que caía era espetacular e, ao mesmo tempo, assustador!

Eu dirigia, frio e calmamente, pela estrada estreita e deserta das montanhas em meio aquela chuva torrencial. Conduzia o veículo com a atenção redobrada, pois é sempre perigoso dirigir à noite e, ainda mais, com um temporal. Além de evitar me envolver num acidente, não queria que meus planos dessem errados naquela noite.

O vento forte ressonava com violência, as gotas d’água pareciam que iam arrebentar o pára-brisa. Quando trovejava e relampejava, por poucos instantes a escuridão dava lugar a um clareado rápido e momentâneo.

Nesse espaço de tempo, podia ver as árvores envergarem com a força do vento, ao mesmo tempo em que as folhas eram arrancadas bruscamente. À minha frente, eu via o longo caminho que ainda tinha que percorrer em meio à tempestade. Parecia que os deuses ou a mãe natureza não estavam muito contentes com a minha presença naquele local e tentavam de diversas maneiras me impedirem de prosseguir.

Por um momento, amaldiçoei o meu destino pela falta de sorte. Justamente naquela noite, decidira resolver aquele compromisso... “por que não o adiei?” – pensava eu. Mas, de certa forma, lá no fundo da minha alma eu sentia que fizera a coisa certa, pois a pessoa que procurava já esperava há muito tempo por mim e eu não poderia fracassar. Há muito procurava o seu paradeiro, e agora que as pistas me levavam até ela, nada, nem mesmo aquela horrível tempestade iria me impedir.

Continuei a dirigir calmamente pela estrada, quando, de súbito, um relâmpago iluminou a escuridão. Vi uma placa que indicou que eu já estava próximo ao meu local de destino.

Dirigi por mais um quilômetro e meio e parei o carro com os faróis ligados para não correr o risco de entrar em colisão com outro veículo que por ventura passasse ali, embora soubesse que esta seria uma hipótese remota, pois quem, além de mim, trafegaria naquele local aquela hora e com aquela tempestade?

Olhei o mapa, - estava no caminho certo. Na verdade, eu dirigi por cinco horas até chegar naquele fim de mundo, mas se não fosse a chuva teria chegado ao local com duas horas de antecedência. O local que eu procurava estava próximo, mais alguns minutos de carro e eu chegaria lá, “um sítio, talvez” - pensava eu.

De repente, um raio atingiu uma árvore e um enorme galho caiu em cima do carro estilhaçando o pára-brisa e amassando o capô do carro!

“Maldição!” - eu gritei, assim que me recompus do tremendo susto que tomara. Passei a mão na testa e vi que tinha sangue, mas não fora nada grave, apenas um pequeno corte superficial.

Desci do carro em meio à tempestade para reparar os danos e ver se tinha possibilidade de seguir viajem. O motor não havia sido avariado, mas retirar aquele enorme galho do caminho daria muito trabalho; além disso, não era prudente ficar exposto em meio aquele temporal, seria melhor procurar ajuda ou um abrigo até a tempestade passar e voltar depois. Então resolvi mudar os planos daquela noite.

Vesti minha capa de chuva, peguei a minha bengala e uma lanterna e segui por uma trilha que estava a poucos metros adiante. Caminhei aproximadamente uns dez minutos com os pés atolados na lama, amaldiçoando a tempestade e mal-dizendo-me da sorte até chegar a uma casa velha perdida no meio do mato.

Não tive dúvidas que poderia encontrar alguém que pudesse me ajudar e teria sucesso na minha proeza, então abri a cerca, entrei no quintal e fui até a porta, bati e gritei pelo morador, na esperança de ser ouvido em meio ao barulho infernal da tempestade.

A porta se abriu e recepção não foi boa, - um homem apareceu com um revólver na mão direita e uma lanterna na mão esquerda e foi logo dizendo para eu colocar as mãos para cima, em tom agressivo e ameaçador!

O homem tinha aproximadamente cinqüenta e cinco anos - eu acho; tinha uma barba branca e usava umas vestimentas maltrapilhas. Em seguida, surgiu outro sujeito mal-encarado, de aspecto rude e grotesco, por trás do outro, com uma espingarda apontada para mim. Este era mais jovem, quarenta e dois anos – eu supunha.

Então outra voz vinda lá de dentro da casa (voz esta que não pude distinguir devido ao susto acometido e o barulho da tempestade), perguntou:

- O que está acontecendo aí fora?

- Não é nada. Pode ficar aí dentro, a situação está sobre controle - respondeu o homem mais novo.

- Quem é você? O que quer? O que faz aqui? – perguntou o homem mais velho.

- Calma, senhores! Por favor, estou perdido e preciso de ajuda, não me machuquem - falei. - Eu estava passando pela estrada, quando o meu carro foi atingido por um galho de árvore, então fiquei preso. Será que um dos senhores poderia fazer a gentileza de me ajudar? – eu perguntei, educadamente.

Então o sujeito mais novo aproximou-se de mim e me golpeou com o cabo da espingarda, na barriga e me chutou duas vezes as costelas!

- Reviste este sujeito - ordenou o homem mais novo ao homem mais velho, porém, este não encontrou nenhuma arma ou documento de identificação, apenas uma boa quantia de dinheiro num saco plástico dentro do bolso da capa de chuva.

- Senhores, por favor, não me machuquem, podem ficar com o dinheiro, eu só quero que me ajudem a pegar a estrada - eu supliquei.

- O que está acontecendo aí fora?! – gritou novamente a voz lá de dentro, então distingui que era a voz de uma mulher, apesar do barulho da chuva.

- Está tudo sobre controle! – gritou novamente o homem mais novo.

- Ok. Este sujeito parece ser inofensivo, ajude-o no que for preciso, mas se ele tentar alguma gracinha acabe com ele - ordenou o mancebo ao homem mais velho e entrou na casa.

- Levante-se, seu molenga! – gritou o velho.

Peguei minha bengala e a lanterna e, pedi educadamente para que o velho me acompanhasse, porém percebi que o outro sujeito fez um sinal através da janela para que o velho me matasse, em silêncio, longe dali - acho que era para ninguém ouvir os tiros.

Acompanhou-me a passos apressados sem mencionar nenhuma palavra, sempre me ameaçando com o revólver e, de vez em quando, eu me detinha no caminho, reclamando da dor na perna, motivo pelo qual necessitava da bengala. Assim foi o percurso até chegarmos à estrada onde se encontrava o meu carro.

Ao chegarmos, pedi ao velho que, por favor, guardasse a arma, pois ele viu que eu estava desarmado e que eu nada poderia fazer contra a sua pessoa, ferido como estava.

O velho hesitou, mas parece que as minhas maneiras o haviam convencido, então ele colocou o revólver por dentro da calça. Em seguida, eu dei-lhe o molho de chaves e pedi que ele entrasse no carro e desse a partida, pois eu estava impossibilitado de dirigir e, caso o motor pegasse, engataria à ré e removeríamos o galho que obstruía a passagem.

Ele concordou, pois não queria ficar na chuva que caía sobre nós. Quando o velho se distraiu e colocou as mãos na maçaneta da porta, meus reflexos foram mais rápidos. Destravei o cabo da bengala da qual pendia uma lâmina embutida ao cabo, uma lâmina longa, afiada e delgada que atravessei as costas do velho até o outro lado do peito!

Na sequência, arranquei-a bruscamente e ele caiu no chão, com os lhos arregalados pela dor e o terror, e se contorcendo todo. O infeliz ainda tentou pegar o revólver para reagir, mas eu enfiei a lâmina com força no olho dele até atravessar e tocar o chão; então ele parou de se mexer.

Eu dei um sorriso sarcástico, escarrei e cuspi na cara daquele porco. Agora eu precisava trabalhar depressa, sabia que a demora do velho preocuparia seus amigos e eles viriam atrás dele.

Apanhei o cadáver, sentei-o no banco do carona. Coloquei a lanterna acesa entre suas pernas para iluminar-lhe o rosto e travei a porta do carona. Deixei a porta do motorista escancarada. Fiz isso para prender a atenção de quem chegasse e encontrasse o corpo, pois a pessoa entraria direto pela porta aberta ao ver o cadáver iluminado pela luz da lanterna.

E não me enganei nos meus pensamentos. Pulei para o banco de trás e me encolhi, sem mover um músculo. A escuridão da noite ajudava-me a me camuflar. E, assim, fiquei de tocaia, com a lâmina em punho, esperando que alguém viesse atrás do velho.

Passado algum tempo, a tempestade cessou, não havia mais trovões e nem relâmpagos, tudo ficara mais fácil, pois agora eu poderia ouvir claramente os passos de quem se aproximasse do carro, e não demoraram a aparecer.

Os passos se aproximaram do carro e uma luz se projetou para dentro. Depois percebi que alguém sentou no lugar do motorista e dirigiu a palavra ao velho sem perceber que este estava morto, porém não teve tempo de obter resposta.

Eu atravessei o banco e o passageiro com a lâmina, não dando tempo a uma reação. Um gemido agudo e sufocado foi emitido pelo homem. Então com um cordão propício, que eu usava para estrangular minhas vítimas, prendi o pescoço do homem por trás e, apertei, apertei, apertei, até a língua e os olhos do desgraçado ficarem para fora.

Era o homem que me agrediu assim que cheguei à casa – o mais jovem. Eu já tinha matado dois, mas havia mais alguém na casa que precisava morrer, era uma mulher.

Abandonei os corpos no local e retornei à casa, bem cautelosamente; sondei os arredores e tudo parecia calmo. Entrei no quintal, caminhei a alguns metros de distância da porta e deitei de bruços no chão como se estivesse morto.

Peguei o revólver que tirei do velho, dei dois tiros para o alto e lancei o revólver para longe, permanecendo deitado no chão, imóvel. Em instantes, a porta se abriu, raios de luz vasculharam rapidamente os arredores e uma voz de mulher gritou:

- Quem está aí?! Quem está aí?!...

Percebi que a luz foi dirigida a mim e continuei imóvel ali no chão. Os passos se aproximavam lentamente de mim. Continuei imóvel. Alguém se agachou próximo de mim com a respiração ofegante e senti uma mão suave e macia tocar-me o ombro para me virar de frente.

Então, de súbito, agarrei com força na mão da mulher que segurava o revólver e ela gritou! Mas seus gritos logo cessaram quando eu passei o canivete em seu pescoço abrindo sua garganta! Ela caiu inerte no chão resvalando-se em sangue!

A mulher tinha aproximadamente trinta e cinco anos e uma beleza exorbitante. Peguei a lanterna e invadi a casa, revistei cada canto da casa e não encontrei ninguém.

Percebi, porém, uma parte falsa no chão da sala: era um alçapão. Abri-o e desci as escadas. Lá encontrei a vítima do seqüestro, amarrada e amordaçada, jogada num colchão velho.

Era um rapaz de quinze anos chamado Douglas Santemberg, que foi seqüestrado dois meses atrás na porta da escola. O rapaz pertencia a uma família nobre e tradicional. A família havia pago o resgate, mas os sequestradores disseram não ter recebido o dinheiro. Mal sabiam aqueles tolos que eu havia pego o dinheiro e estava atrás deles, já que pediram à família para que a polícia e a imprensa ficassem fora do caso.

É claro que naquela noite eu não contava com aqueles contratempos, mas eu já estava praticamente no cativeiro e não custava nada ir a pé até lá. Foi uma pequena mudança de plano e um tempo imprevisto.

As condições do cativeiro eram precárias, a vítima comia e fazia suas necessidades ali mesmo. Eu o desamarrei e procurei tranqüilizá-lo, dizendo que eu não o faria mal, que ele agora estava livre e que seus algozes estavam mortos. Além disso, estava prestes a amanhecer e a estrada principal se encontrava a alguns metros dali.

Ditas estas palavras, me despedi do jovem, apanhei minha bengala e retornei à estrada. Retirei o enorme galho que obstruía a passagem, entrei no carro e segui viagem com o dinheiro do resgate no porta-malas.

Passado algum tempo ouvi rumores sobre o desfecho do misterioso seqüestro do jovem Douglas Santemberg. Segundo a versão do rapaz, um homem de olhar singelo e cicatriz no rosto, usando uma bengala, o libertou de sua prisão. E, ninguém soube explicar ou encontrou pistas do assassino dos seqüestradores. Tampouco se soube do paradeiro do dinheiro do resgate, pago pela família do rapaz.

Neste momento, - eu estou à procura de outra recompensa.

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